
A Necessidade Aguça o Engenho
«Olha mãe, não é lindo aqui? Estes campos deslumbrantes e para onde quer que olhes, existem montes de lenha e tufos de ervas que te convidam a esconderes-te neles!»
«Olha mãe, não é lindo aqui? Estes campos deslumbrantes e para onde quer que olhes, existem montes de lenha e tufos de ervas que te convidam a esconderes-te neles!»
O pequeno ouriço-cacheiro está entusiasmado. Ele foi viver para o Alentejo com a sua família há apenas alguns dias. O pai ouriço abriu lá um consultório médico. Depois de todos terem ajudado ativamente com as mudanças, chegou finalmente a altura de irem explorar a região.
Enquanto o pai trata do seu primeiro doente – um pássaro com uma asa torcida – a mãe ouriço, o pequeno Filipe e a sua irmã Isa dão uma vista de olhos pelas redondezas. Nos seus pensamentos, Filipe já se vê deitado no campo, a mandriar ao sol no meio da erva alta. Esse é o seu passatempo preferido.
A manhã seguinte começa com muita emoção. O pequeno Filipe e a irmã Isa vão à escola dos ouriços pela primeira vez. Em menos de nada, ficam a conhecer todos os meninos ouriços da zona. Isa não perde tempo e já combinou um encontro com a Beatriz, uma menina ouriço que veio do Algarve.
O pequeno Filipe tem planos de ir apanhar sol para o prado. Mas depois lembra-se dos trabalhos de casa que a professora Elvira lhes passou. Ela pediu às crianças para pensarem no que queriam ser quando fossem grandes. Por muito que tente, o pequeno Filipe não se consegue lembrar de uma profissão em que possa mandriar o dia inteiro.
Pensar deixa-o tão cansado que rapidamente adormece.
Nesse mesmo momento, a tartaruga Amanda passa para o trabalho. A relva cresce tão depressa nesta zona que tem de ser cortada pelo menos uma vez por semana. Cantarolando, a Amanda começa a trabalhar.
Entretanto, o pequeno ouriço Filipe sonha profundamente. Sonha que está a curar um elefante da sua depressão com acupunctura, quando, de repente, se transforma no jardineiro do jardim zoológico de Lisboa e está encarregado de cuidar da relva.
Um ruído desagradável acaba rapidamente com o sonho do pequeno Filipe. Ele salta assustado. Vê o rosto de uma tartaruga completamente perturbada – a Amanda! A tartaruga passou acidentalmente por cima do pequeno Filipe com o cortador de relva.
«Es-ta-ta-ta-tás bem?» – gaguejou a Amanda, ainda em estado de choque.
«Claro!» – diz o pequeno Filipe, sem ainda se aperceber da real dimensão do que tinha acontecido.
«Peço imensa desculpa». Não te vi por causa da relva alta e acabei cortando os teus lindos espinhos» – explica Amanda.
O pequeno ouriço começa lentamente a aperceber-se da gravidade da situação. Ele tira um espelho da mochila, observa a sua imagem refletida e... fica completamente horrorizado. Nem um único espinho lhe restou na cabeça. O pequeno Filipe corre rapidamente para o monte de lenha mais próximo para se esconder. Ninguém poderia vê-lo assim. A Amanda tenta confortar o pequeno ouriço mas em vão. Triste, vai-se embora.
De repente, os olhos dela iluminam-se. Teve uma ideia!
Vai rapidamente à loja de ferragens da Rute. Pouco depois, corre para junto do pequeno Filipe com um saco de compras debaixo do braço.
«Fecha os olhos» – pede Amanda ao pequeno ouriço. «Só os podes abrir quando eu disser».
De olhos fechados, o pequeno Filipe aguarda o que aí vem. Sente algo a sacudir-lhe a cabeça.
«Abre os olhos!» – grita a Amanda enquanto pega num espelho.
O pequeno Filipe olha para o espelho e vê... ESPINHOS!!! Agora, sim, já parece um ouriço-cacheiro outra vez.
«Como conseguiste?» – pergunta o pequeno Filipe.
A Amanda responde: «Até que os teus espinhos voltem a crescer, podes usar esta escova de arame. Podes prendê-la com um elástico sempre que quiseres».
No dia seguinte, o Filipe aparece rodeado de admiradoras e os rapazes ficam mortinhos por saber mais acerca do novo penteado do pequeno ouriço.
«Como é que consegues ter os picos tão direitos?» – pergunta um dos miúdos.
A «necessidade aguça o engenho» – responde o pequeno Filipe.
Depois deste incidente, agora, já sabe exatamente o que quer ser quando for grande. Um inventor! Obrigado, Amanda...
J. Schmidt, Bad Grund